ACONTECEU COMIGO: Mulheres, Narrativas de Vida e Violências nos quadrinhos de Laura Athayde
Aconteceu comigo; violências; narrativas de vida; Laura Athayde; quadrinistas brasileiras.
No Brasil, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a cada sete horas uma mulher é assassinada e a cada 10 minutos uma menina ou mulher é vítima de estupro. Estes números são maiores quando observados, diz a pesquisa, a partir do viés de classe e raça. É esse histórico de violência, acredito, que aparece refletido na série de quadrinhos Aconteceu comigo, da artista brasileira Laura Athayde, objeto desta pesquisa. Na coletânea, a quadrinista, que produz HQs digitais principalmente para sites de redes sociais, propõe-se a narrar as vidas de mulheres brasileiras a partir de temas variados. Partindo da hipótese de que a artista constrói a imagem das mulheres brasileiras em sua pluralidade, preocupando-se em apresentá-las de forma que nestes quadrinhos emerjam vivências e experiências invisibilizadas e apagadas em outros contextos nacionais, acionei temáticas como narrativas de vida, artivismo digital e feminismo decolonial como lentes para olhar essas HQs. Amparada por estas ideias, realizei uma análise a partir de um viés teórico metodológico interdisciplinar, sobretudo com ênfase na semiolinguística, ainda que tenha também me respaldado em teorias como narrativas de si, comunicação, ativismo digital, feminismos e histórias em quadrinhos. Essas questões me permitiram identificar seis eixos narrativos a partir dos quais essas vidas são relatadas: misoginia, violências, preconceitos e opressões, racismo, LGBTfobia e saúde mental. A partir deles, analisei as colocações das mulheres — narradora-enunciadora-personagem — que relatam fragmentos de suas vidas em Aconteceu comigo, para entender que acionando o ethé de resistência e superação elas refutam imaginários fortemente estabelecidos no país na tentativa de controlar e cercear suas vidas. Nesse sentido, entendo que ao adotar um gesto feminista e decolonial, Laura Athayde se preocupa tanto em representar as mulheres brasileiras em sua diversidade de corpos e vivências, quanto em apresentar o histórico de vitimização e violências, em suas diversas formas, cometidas contra as mulheres no país. Com isso, ela utiliza-se de seu espaço de expressão artivista feminista no ambiente digital para se posicionar politicamente contra essas violências que marcam nossas trajetórias como mulheres brasileiras, buscando afetar e ser afetada pela publicização e narração destas experiências.